PARCELA DE MAIOR RELEVÂNCIA TÉCNICA E VALOR SIGNIFICATIVO

Quem de vocês que participa de licitações e já viu edital exigindo, para a comprovação da capacidade técnica, a necessidade de demonstração da execução de quantitativos mínimos em obras e serviços de características semelhantes?

Pior: esta exigência costuma vir acompanhada do seguinte: limitada às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto licitado.

Instaura-se a confusão, obviamente. Afinal, quanto poderá ser considerado um quantitativo mínimo? e qual é a parcela de maior relevância da obra ou serviço ? O valor significativo é o aspecto mais importante a ser observado?

É preciso respirar fundo e enfrentar o edital de licitação com coragem e senso crítico nessas horas. 

Conhecer a legislação também é fundamental. 

Ah, e acompanhar o entendimento dos tribunais de contas também é muito importante.

Mas vamos lá.

O QUE DIZ A LEI

O art. 30 da lei 8.666/93 diz o seguinte:

Art. 30.  A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a:

II – comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos;

§ 1o  A comprovação de aptidão referida no inciso II do “caput” deste artigo, no caso das licitações pertinentes a obras e serviços, será feita por atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registrados nas entidades profissionais competentes, limitadas as exigências a: 

I – capacitação técnico-profissional: comprovação do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos;     

§ 2o  As parcelas de maior relevância técnica e de valor significativo, mencionadas no parágrafo anterior, serão definidas no instrumento convocatório.             

     § 3o  Será sempre admitida a comprovação de aptidão através de certidões ou atestados de obras ou serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior.

O primeiro ponto que chama atenção diz respeito à ligação entre as exigências de quantitativos e parcelas significativas à capacidade técnica profissional, que já tratamos aqui. Basicamente está ligada ao profissional responsável técnico pela execução do contrato, não à empresa prestadora do serviço.

Porém, conforme tratamos aqui, o Tribunal de Contas da União estende a demonstração desse tipo de capacidade técnica às pessoas jurídicas, conforme exposto na Súmula/TCU 263:

Para a comprovação da capacidade técnico-operacional das licitantes, e desde que limitada, simultaneamente, às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto a ser contratado, é legal a exigência de comprovação da execução de quantitativos mínimos em obras ou serviços com características semelhantes, devendo essa exigência guardar proporção com a dimensão e a complexidade do objeto a ser executado.

A nova lei de licitações ( 14.133/2021) deixa as coisas mais claras:

Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a:

I – apresentação de profissional, devidamente registrado no conselho profissional competente, quando for o caso, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, para fins de contratação;

II – certidões ou atestados, regularmente emitidos pelo conselho profissional competente, quando for o caso, que demonstrem capacidade operacional na execução de serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, bem como documentos comprobatórios emitidos na forma do § 3º do art. 88 desta Lei;

III – indicação do pessoal técnico, das instalações e do aparelhamento adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada membro da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos;

IV – prova do atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso;

V – registro ou inscrição na entidade profissional competente, quando for o caso;

VI – declaração de que o licitante tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação.

§ 1º A exigência de atestados será restrita às parcelas de maior relevância ou valor significativo do objeto da licitação, assim consideradas as que tenham valor individual igual ou superior a 4% (quatro por cento) do valor total estimado da contratação.

§ 2º Observado o disposto no caput e no § 1º deste artigo, será admitida a exigência de atestados com quantidades mínimas de até 50% (cinquenta por cento) das parcelas de que trata o referido parágrafo, vedadas limitações de tempo e de locais específicos relativas aos atestados.

Viram? A nova lei deixa muito menos (ou quase nenhum) espaço para o gestor público decidir por ele mesmo o que é parcela relevante, valor significativo ou quantitativo mínimo.

A lei 8.666/93, devido a sua abstração e generalidade, levou os órgãos públicos licitantes a trabalharem com bastante liberdade, o que por sua vez levou os tribunais de contas a agirem com rigor na limitação dos excessos, o que gerou insegurança dada a imprecisão dos termos.

Mas, para deixar claro, ainda que a licitação do seu interesse seja regida pela Lei 8.666/93, é recomendável que observe com cuidado as definições de parcela relevante, valor e quantitativos mínimos, sempre com o objetivo de impedir abusos que levam a exclusão de licitantes e diminuição da competitividade da licitação.

É válido considerar como “parcela de maior relevância técnica” o conjunto de características e elementos que individualizam e diferenciam o objeto, evidenciando seus pontos mais críticos, de maior complexidade técnica e risco mais elevado para a sua execução. É aquilo que é realmente caracterizador da obra ou do serviço, que é de suma importância para o resultado almejado pela contratação.

MAS E QUANDO O EDITAL NÃO FALA NADA ? IMPUGNAÇÃO

Bem, é obrigatória que o órgão licitante, quando optar por estabelecer qualquer tipo de limite autorizado por lei em sua licitação, defina claramente o que entende ser uma qualificação técnica adequada para a execução do contrato. 

Mais: é obrigatório que apresente justificativa evidenciando os motivos por que implementou exigências restritivas no seu edital de licitação.

Quando a Administração Pública não faz constar no edital o que exatamente considerará como parcela de maior relevância, a saída que a empresa interessada tem a sua disposição é a impugnação do edital.

A impugnação do edital de licitação é o instrumento capaz de atrair a atenção do órgão público para a lacuna presente no edital, e deixar claro que esta lacuna implicará em redução do número de interessados e, com isso, através da diminuição das opções de escolha, provocar o desatendimento do interesse público subjacente a todas as contratações públicas.

O mesmo deve ser feito quando a escolha da parcela mais relevante for inadequada. Pode acontecer de o gestor público apontar determinada parte da obra ou serviço como a mais complexa, a partir da consideração apenas dos valores envolvidos. Contudo, essa parcela mais onerosa pode não representar a parcela da execução que envolva maior dificuldade e experiência para sua execução, como, por exemplo, um ponto onde a tecnologia tenha relevância fundamental para a conclusão da atividade; podendo ser menos impactante financeiramente, mas de alta repercussão no conjunto do contrato.

Também nesse caso a impugnação é o mecanismo pelo qual o licitante corrige o edital e o torna mais adequado à realidade do mercado, sobretudo quanto este é especializado, pois muitas vezes o gestor público não conhece integralmente a dimensão e nuances daquilo que pretende contratar.

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